Capítulo 1: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/10/capitulo-1.html
Capítulo 2: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/10/capitulo-2.html
Capítulo 3: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/10/capitulo-3.html
Capítulo 4: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/10/capitulo-4.html
Capítulo 5: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/10/capitulo-5.html
Capítulo 6: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/10/capitulo-6.html
Capítulo 7: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/10/capitulo-7.html
Capítulo 8: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-8_6.html
Capítulo 9: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-9.html
Capítulo 10: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-10.html
Capítulo 11: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-11.html
Capítulo 12: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-12.html
Capítulo 13: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-13.html
Capítulo 14: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-14.html
Capítulo 15: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-15.html
Capítulo 16: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-16.html
Capítulo 17: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/capitulo-17.html
Epílogo: http://www.escolhadetessa.blogspot.com.br/2013/11/epilogo.html
A Escolha de Tessa
ELE QUER FILHOS, ELA, NÃO. E AGORA?
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação (fértil) da autora. Qualquer semelhança é mera coincidência. Eu garanto!
quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014
quinta-feira, 28 de novembro de 2013
EPÍLOGO
Um ano se passou.
Eu
estava sentada numa poltrona na recepção do hotel em João Pessoa, quando me
lembrei de uma de minhas conversas com Nina, no período em que fiquei afastada
de Inácio. Ela tinha dito:
-
Aproveite esse tempo que Inácio está te dando e reflita bastante. Você seria
capaz de engravidar por amor? Sua convicção de não ter filhos encontra respaldo
em seu lado mais espiritual, transcendente? Busque as respostas, Tessa. E,
quando chegar a uma conclusão, prepare-se internamente para as consequências,
sejam elas quais forem. Você tem, sim, razão ao dizer que os filhos mudam a
vida do casal. Se mudam! E não é para pior nem para melhor, a vida simplesmente
muda.
Fez,
então, uma pausa e completou:
-
Descubra do que realmente é feita e comece a lutar pelo que quer.
Tudo
mudou desde então.
A
aliança em meu dedo simbolizava o recomeço, a nova etapa de meu relacionamento
com Inácio, um relacionamento mais maduro, cuja nota essencial era a liberdade.
Éramos livres e estávamos juntos porque escolhemos um ao outro e a nossa
relação.
Depois
que ele voltou, decidimos nos mudar para a Vila Mariana. No início, tudo o que
queríamos era viver aquele momento. Sem pressão, sem cobranças. Não revivemos o
passado nem antecipamos o futuro. Tentamos nos equilibrar no presente.
Respeitamos o nosso reencontro.
Durante
muito tempo, eu havia insistido na segurança e na continuidade, no sentido de
permanência. Mas acabei entendendo que a única continuidade possível na vida
era o crescimento.
Senti
uma vontade súbita de falar com Nina. Tirei o celular da bolsa e disquei seu
número. Ela atendeu de imediato.
-
Como está se sentindo? – perguntou.
-
Muito bem. É maravilhoso não me sentir aterrorizada o tempo todo.
-
Como assim?
-
Com a possibilidade de engravidar.
Fiz
uma pausa e respirei fundo. Então, prossegui:
-
Achava que ficar grávida seria a pior coisa que poderia me acontecer, mas agora
que “o pior” aconteceu, não é tão mau. É até bom, para falar a verdade.
-
É até bom? Depois dessa posso dizer que já ouvi de tudo na vida... – Nina riu,
com gosto.
-
Sim, é bom. Não o tempo inteiro, é claro. Sinto enjoos, e isso está acabando
comigo. Além disso, tenho cólicas esquisitas, meus seios estão inchados e
doloridos, e estou mais melodramática. Sem dizer que estou engordando horrores e,
ao mesmo tempo, não posso comer o que gosto. Mas Inácio tem me paparicado como
nunca e – surpresa! – a gestação, por vezes, me emociona. Sinto uma coisa
esquisita todas as noites quando Inácio saca o estetoscópio, se debruça sobre a
minha barriga e passa um tempão auscultando o coração da nossa menininha.
-
Por falar nisso, já escolheram o nome?
-
Tenho um em mente, mas ainda não disse a ele...
-
Puxa, estou curiosa!
-
Você será a primeira a saber, se ele concordar.
-
Ótimo, então. Me ligue a qualquer hora, ok?
-
Pode deixar. E cuida bem da minha casinha, hein?! – brinquei.
Nina
fora passar aqueles dias com a família na Vila Mariana.
-
A propósito, Tessa, está tudo ótimo por aqui. Mas aconteceu um fato.
-
O quê? – perguntei, já preocupada com Bela.
-
O seu vizinho foi preso.
-
Quem? O Daniel?
Ele
andava meio sumido. Desde que eu e Inácio nos mudamos, eu mal o via. Achei que
fosse por nossa causa. Mas, mais uma vez, eu superestimava a minha importância.
-
Sim.
-
Meu Deus! Por quê? O que foi que ele fez?
-
Polícia Federal, minha filha. Operação Firewall. Ao que tudo indica, ele é um hacker procurado. Faz parte de uma
quadrilha especializada em fraudes pela internet. Roubavam mais de um milhão de reais por mês. Deu
até no telejornal.
-
Estou pasma... – me limitei a dizer.
-
A atividade de luthier era só
fachada.
Então,
eu não estava tão errada assim. Ele realmente guardava um segredo obscuro.
Considerando que as acusações fossem verdadeiras, é claro. Como advogada, eu
sempre partia do princípio da presunção de inocência. No caso de Daniel,
contudo, algo me dizia que ele era culpado. Quem diria?! Ele não mentiu quando
disse que, se quisesse, poderia trabalhar 24 horas por dia e que, por isso, se
dava o luxo de escolher os serviços. Agora eu não duvidava de que ele arrumava
mais “trabalho” do que conseguia dar conta. Enfim, Daniel, o homem mais
solteiro que já conhecera, foi parar atrás das grades. E me perguntei se
aquelas lesões faciais tinham sido mesmo causadas por um morcego.
Me
despedi de Nina, ainda em choque, no exato instante em que Inácio cruzava o hall do hotel, caminhando em minha
direção.
-
Vamos? Está na hora! – anunciou.
Decidi
não comentar nada sobre Daniel. Ele estava animado e alegre. Eu contaria em
outro momento.
Levantei e segurei a mão
que ele me estendeu.
Caminhamos
até a entrada do hotel, onde Inácio fez sinal para um táxi.
-
Ainda parece uma grande aventura – eu disse, afastando de vez o incidente com
Daniel dos pensamentos.
-
O quê? – ele perguntou, se acomodando ao meu lado no banco traseiro.
-
A gravidez – apontei a barriga de 5 meses.
-
Eu sei – ele sorriu, concordando. Você está com medo?
-
Um pouco – respondi, sinceramente. Não pensou que eu passaria de Cassandra a
Pollyanna num piscar de olhos, não é?
Ele
riu.
-
Nem quero isso – respondeu, com sinceridade. Nem Cassandra nem Pollyanna. Quero
a Tessa.
Aquilo
balançou meu coração. Inácio sabia dizer coisas simples e encantadoras ao mesmo
tempo.
-
Não vivo mais assombrada por um medo vago e constante, mas ainda tenho receio
das necessidades e complicações do cotidiano. Todos os dias, antes de me
levantar, respiro fundo, a fim de reunir coragem para continuar o que
começamos.
-
É natural, Tessa – ele disse, compreensivo. Seria estranho se fosse diferente.
-
Mas tem algo interessante: desde que engravidei, não tenho pensado com tanta
frequência na falta que a minha mãe me faz.
-
Sério?
Fiz
que sim com a cabeça.
-
Nem me importo de falar disso.
Ele
olhou surpreso.
-
Sempre tive horror a que o fato de minha mãe ter abandonado a família virasse
uma espécie de bônus e angariasse simpatia a meu favor. Não queria ser motivo
de pena. Por isso, estava sempre na defensiva, pronta para contra-atacar o que
quer que me parecesse uma ameaça. Isso parece tão distante agora...
Ele
acariciou meus cabelos.
-
Você nunca falou sobre isso.
-
É a primeira vez que falo em voz alta. Me custou esforço admitir para mim
mesma.
-
Você está tão mudada, Tessa. E ao mesmo tempo conserva os traços mais
encantadores daquela menina de 22 anos que conheci.
-
Cresci, Inácio. Já era tempo, não?
Ele
sorriu.
-
Quer solidão maior do que essa espécie de
orfandade de nós mesmos, quando passamos a carregar dentro de nós um estranho
que tem nosso nome e nosso rosto, mas que não reconhecemos e com quem não temos
a menor afinidade?
Suas
sobrancelhas se curvaram em sinal de interrogação.
-
Leila Ferreira – eu expliquei.
Nesse
instante, chegamos ao destino: Praia do Jacaré. Inácio pagou a corrida e
descemos.
Engraçado!
Eu achei que custaria a engravidar. Mas foi tudo muito rápido. Compareci à
clínica de reprodução assistida numa quinta-feira pela manhã. Nada foi como eu
imaginava. Na prática, a inseminação artificial era como um exame ginecológico.
O médico abriu a minha vagina com aquele “macaco” e introduziu uma seringa com
um canudinho na ponta que vai até o útero, com o material preparado. No início
da noite, senti um pouco de cólica no baixo ventre, sobre a qual o médico já
havia me advertido, e nada mais. Pouco tempo depois o ultrassom acusou a
gravidez.
Agora
eu estava ali, aos cinco meses de gestação, curtindo as últimas férias antes do
parto. Foi Inácio quem escolheu João Pessoa. Gostei da ideia porque ainda não
conhecia a cidade.
-
Reservei uma mesa para nós – ele disse, me conduzindo a um restaurante, cujo deck dava para a praia.
A
vista era digna de um cartão postal.
Assim
que chegamos à beirada do deck, um
fotógrafo se aproximou e perguntou se podia tirar a nossa foto. Inácio disse
que sim e se postou atrás de mim, envolvendo a minha cintura com as mãos.
Ficamos de perfil para o fotógrafo, que disparou vários flashes, com a praia e o pôr do sol como pano de fundo. Intuí que
ele logo tentaria nos vender aquelas fotos, mas ele partiu sem dizer nada, o
que me desapontou.
Sentamos
à mesa e pedimos nossas bebidas. Nesse instante, o pôr do sol ganhou uma trilha
sonora. Um saxofonista e um violinista começaram a entoar o Bolero de Ravel.
Aquilo me tocou profundamente.
-
Meu amor, eu sei que disse que gostaria de ver o rostinho da nossa filha antes
de escolher o nome, mas acho que mudei de ideia – comecei.
Inácio
me olhou surpreso.
-
É mesmo?!
-
Sonhei com ela. E com um nome para ela.
Ele
ficou em silêncio, na expectativa.
-
É só uma ideia. Você tem poder de veto, ok? – eu disse.
-
Está bem. Qual é o nome?
Respirei
fundo.
-
Mariana – disse, por fim.
Os
olhos dele se encheram de lágrimas.
-
É perfeito, Tessa! – disse e segurou as minhas mãos entre as suas e as beijou.
Então,
o fotógrafo voltou, com uma blusa branca nas mãos. Assim que ele a estendeu na
mesa, eu entendi tudo. A foto já estava estampada nela. E no alto havia a
inscrição: “Agora somos três”. Era a cara de Inácio preparar aquela surpresa.
Vesti
a camiseta por cima do body que
usava. Sim, agora somos três, pensei,
com emoção.
E
algo me ocorreu: sem humanidade, não há sentido. Não sei por quanto tempo eu
seria capaz de sobreviver envolta naquela espécie de inteligência artificial.
Era preciso viver, experimentar, sentir a brisa no rosto, se arriscar e até se
machucar. Faz parte de ser humano. E, sem isso, não há a mínima chance de haver
felicidade.
Não
sei se a maternidade serve para todo mundo. Ou melhor, para toda mulher. Assim
como não sei se a paternidade se ajusta a todo homem. Algo me diz que não. Em
alguns casos, a recusa em ser pai ou mãe será uma questão superável. Em outros,
não; será irrevogável. Por isso, cada experiência é única e deve ser respeitada
como tal.
Eu
fui até a beira do abismo. E me libertei. Hoje conheço as razões em que apoiava
a minha recusa. Elas não existem mais. Descobri que não eram legítimas. E que
eu não tinha mais motivos para fugir.
Se
você me perguntar se vai dar tudo certo, responderei com franqueza: É cedo para
dizer. Não sei que tipo de mãe eu serei. Não sei de que forma a maternidade vai
impactar a minha vida, a minha relação com Inácio, enfim, o meu mundo. Fico
apreensiva ao imaginar alguém dependendo de mim para tudo. Tenho medo de falhar,
de não conseguir. Mesmo assim, decidi encarar. E sei que tenho um companheirão
ao meu lado.
Lá
vou eu mais uma vez: para o eterno recomeço. Para uma nova narrativa. Quem sabe
um dia eu possa contá-la?
“Sei que viver dói. Mas sei também que
não viver dói mais. É a dor incontornável das lacunas, do vazio.”
“Viver é às vezes o mais doloroso dos
exercícios. Mas é também a possibilidade de nos depararmos diariamente com o
que nos apaixona, nos move, nos arrebata, nos causa espanto, nos faz rir.”
(Leila Ferreira)
“O egoísmo pessoal, o comodismo, a
falta de generosidade, as pequenas covardias do cotidiano, tudo isto contribui
para essa perniciosa forma de cegueira mental que consiste em estar no mundo e
não ver o mundo, ou só ver dele o que, em cada momento, for suscetível de
servir aos nossos interesses.”
(José Saramago)
Texto:
Cynthia França
Revisão:
Arilma Peixoto
Colaboração:
Adriano Machado, Anita Lima, Letícia Paratella, Licínio Porto, Lorena Porto,
Lucilene Oliveira, Lucíola Pereira.
CAPÍTULO 17
Ficamos olhando um para o outro durante um tempo
impreciso, que me pareceu longo. O olhar de Inácio era tão intenso que quase
perdi o equilíbrio e torci o tornozelo.
Ele
estava diferente: com a pele mais bronzeada, os cabelos mais compridos e caídos
na testa e um cavanhaque que não estava ali quando ele partiu. Continuava
lindo, contudo. Lindo e extremamente charmoso. Essa última constatação me
preocupou, porque eu não sabia se eram os pensamentos corretos diante das
circunstâncias. Ele ainda não tinha dado nenhuma pista do que tinha ido fazer
ali. Estava sério, com uma expressão impenetrável. E se aquilo fosse o começo
do fim? E se aquela seriedade não passasse de solenidade? Uma falsa esperança
era pior do que nenhuma esperança? Eu não queria terminar o dia arrasada de
dor.
-
Oi, Tessa – ele, por fim, rompeu o silêncio.
-
Oi, Inácio.
-
Você cortou o cabelo – disse, num tom neutro.
-
Sim – me limitei a responder.
-
Ficou bonito.
Esperei
que ele dissesse algo mais, mas ele não disse. Então, aproveitei a situação.
Antes que os pensamentos começassem a tomar forma em minha mente e eu perdesse
a coragem, soube que tinha que falar de uma vez. Suspirei, engoli a sensação de
náusea e comecei:
-
Inácio... – fiz uma pausa e lutei por um pouco de ar – Preciso te dizer algo.
Ele
me lançou um olhar que eu não compreendi. Mesmo assim, fui em frente.
-
Apenas me ouça, está bem?
Ele
fez que sim com a cabeça.
-
Está bem. Mas será que eu posso entrar? – perguntou.
Fui
pega de surpresa pela pergunta. Uma questão prática, com a qual eu não contava.
Estava em outra dimensão naquele momento.
-
Claro! – respondi rapidamente. A casa é sua!
Foi
então que me ocorreu que, se nos separássemos, teríamos que vender o imóvel e
aquilo era a última coisa que eu desejava naquele momento – penúltima, na
verdade. A última coisa que eu queria era o divórcio, que infelizmente parecia
cada vez mais próximo. O futuro que se desenrolou diante dos meus olhos
naqueles instantes me deixou tensa: vender a casa, recomeçar uma vida sem
Inácio logo agora que eu tinha descoberto tantas coisas importantes sobre nós.
Ele
estava de pé, no meio da sala, me encarando. Aguardando o que eu tinha a dizer.
Me obriguei a aterrissar e afastar
aqueles pensamentos. Independentemente do que ele fosse dizer, eu precisava
falar primeiro. E se depois de tudo ele não me quisesse mais, eu não ia me
sentir patética ou humilhada. Teria feito o certo, o que devia fazer e pronto.
Não permitiria que o Ego me atrapalhasse daquela vez. Aquele seria um
contraponto ao orgulho e à vaidade. Eu iria até o fim, doesse o que doesse. Este é seu marido, disse a mim mesma. O homem que você ama. O homem que carrega
mais de uma década da sua vida. O homem que você quer que seja o pai do seu
filho. Então, faça o que tem que fazer!
-
Inácio, independentemente do que você tenha vindo fazer aqui, quero que saiba
que deixar você ir embora foi o maior erro que cometi na vida.
Ele
não disse nada. Nossa, aquele silêncio foi angustiante. Tive a impressão de que
ele ia soltar um “Sinto muito, Tessa, mas nós amadurecemos em direções
diferentes. Que pena que isso não tenha acontecido quando eu estava
interessado”.
-
Me desculpe por tudo, de verdade – continuei, aos trancos – Estou muito
arrependida. E, se você ainda quiser, eu quero muito ser a mãe do seu filho.
Ele
permaneceu em silêncio por mais um tempo, o que me deixou apreensiva ao
extremo. Achei que fosse desmaiar. Eu já estava a ponto de perguntar se ele
havia mudado de ideia quando Inácio estendeu a mão e a colocou sobre o meu
rosto. O toque de seus dedos em minha pele me fez estremecer.
-
Senti muito a sua falta, Tessa – disse, finalmente, com a voz rouca.
Então,
segurou o meu rosto com as mãos grandes e firmes e me beijou. Um beijo intenso,
provocante e tranquilizador ao mesmo tempo.
Não
sei quanto tempo o beijo durou, mas, ao final, eu o peguei pela mão e o levei
até o quarto que ele tinha idealizado, mas em que não tinha colocado os pés
ainda.
Paramos
junto à cama e eu fechei os olhos. Ele então beijou minhas pálpebras, a ponta
do meu nariz e desceu até o pescoço. Beijos leves e sensuais. Em seguida,
beijou o canto da minha boca e suavemente puxou o meu lábio inferior com os
dentes.
Finalmente,
ele beijou minha boca. Um beijo quente e poderoso. Era maravilhoso estar ali
com ele, inalando seu cheiro, tocando seu corpo. Então, ele parou subitamente.
Olhou bem para mim e disse:
-
Tessa, eu te amo mais do que já amei qualquer outra pessoa. Mais do que você
possa imaginar.
Com
delicadeza, ele começou a tirar minhas roupas. Assim que a última peça caiu,
ele me admirou longamente e disse:
-
Você é tão linda!
Tentei
retribuir o favor e tirar as roupas dele, mas as minhas mãos tremiam tanto que
acabei desistindo. Deixei por conta dele.
A
sensação de sua pele sobre a minha era indescritível. Preciso fazer uma pausa
aqui para dizer que Inácio não era daqueles homens desesperados, que se
preocupam antes de tudo consigo mesmos. É claro que, por termos ficado quase dois
meses afastados, suas necessidades eram urgentes. Nem por isso ele se absteve
de atender às minhas próprias necessidades, com a devoção infinita que lhe era
peculiar.
Por
fim, nós nos abraçamos com força, como se não estivéssemos próximos o
suficiente. Ficamos um bom tempo assim até que Inácio foi à cozinha e trouxe
alguns cachos de uvas para comermos.
Passamos
o resto do dia e a noite ali, deitados na cama, abraçados e nos beijando,
conversando durante horas a fio.
Como
era maravilhoso viver isso outra vez! Nada mais existia, apenas nós dois e a
nossa união perfeita. A essência do nosso relacionamento não desaparecera,
somente precisara ser reafirmada.
Na manhã seguinte, levantei bem cedo e preparei um
chá de hortelã, enquanto Inácio ainda dormia. Antes de sair do quarto, eu o
observei deitado, parcialmente coberto, e senti um prazer repentino em dormir e
acordar novamente ao lado do homem por quem me apaixonara perdidamente um dia.
Caminhei
com a xícara fumegante até o canteiro de margaridas no quintal da casa. Parei
diante dele para admirar duas borboletas azuis que estavam ali.
Não notei a aproximação de Inácio. Só quando ele já
estava bem perto, senti seu cheiro. Sorri para ele ao mesmo tempo em que ele me
beijava a face.
- Acho que é o cenário perfeito – ele disse.
Olhei confusa.
Então, ele retirou uma caixinha preta do bolso do
roupão que vestia e me entregou. Arranquei o laço e abri. Deparei-me com o par
de alianças mais lindo que já tinha visto. Largas, abauladas, cravejadas de
brilhantes.
- Que tal recomeçar? – ele perguntou, notando a
minha surpresa.
- Quando você as comprou? – perguntei, confusa.
- Quando estava na Itália.
- Mas... Você não sabia que eu ia concordar em ter
um filho...
- Não, Tessa, eu não sabia. O que prova que
algumas coisas eu só aceito de você. Ou melhor, por você.
Senti meu coração acelerar absurdamente. Era uma
prova de amor que eu não esperava. Uma prova de amor que não mudaria os nossos
planos, que já tinham sido traçados, mas que, ao mesmo tempo, mudava tudo.
Abracei Inácio enquanto as lágrimas desciam pelo
meu rosto.
- Sim, vamos recomeçar – eu disse, removendo as
antigas alianças, que continuavam em nossos dedos e que não tinham sido
retiradas durante aqueles meses em que ficamos afastados. Aquilo devia ter um significado.
Com certeza, tinha.
Cobri o sulco branco que surgiu no dedo anular
esquerdo de nossas mãos com a nova aliança.
- Eu te amo, Inácio – disse, olhando bem dentro de
seus olhos, antes de beijá-lo.
Não sei quanto tempo ficamos ali, admirando o
jardim e as alianças e fazendo juras de amor eterno. Uma renovação de votos
testemunhada por Bela, pelas margaridas e pelas borboletas azuis.
Lá pelas tantas, Inácio disse:
- Nossa, Tessa, foi horrível chegar em casa e não
te encontrar lá. Cheguei a imaginar que você tinha ido embora.
- Eu não faria isso.
- Então, liguei para a Nina e ela me disse que
você estava aqui. Fiquei bem surpreso.
- Construí uma história de amor com essa casa na
sua ausência.
Ele me olhou, confuso.
- O cenário do meu solilóquio – completei.
- Tentei saber como você estava, mas Nina não me
disse nada. Sua irmã é leal – ele riu. A única coisa que consegui foi fazê-la
prometer que não te avisaria que eu estava a caminho.
- Disso se conclui que ela é leal a você também.
- Uma aliada de peso, hein?! – ele piscou.
- Sinto que, com ela, podemos contar sempre.
- Isso é incrível, Tessa! – ele disse,
entusiasmado.
Pela primeira vez na vida, eu colocava o que eu
tinha na frente do que eu não possuía, e isso não passou despercebido a ele.
Durante anos, eu me apeguei à mágoa, que me
manteve acorrentada. Era libertador enxergar que a minha vida não se resumia ao
abandono de minha mãe. Descobri que a atitude dela pouco ou nada tinha a ver
comigo. Como Inácio dissera certa vez, esse tipo de coisa não pode ser
atribuída a um único fator. A depressão pós-parto pode ter sido o gatilho, mas
em geral a causa é mais complexa e envolve uma série de fatores e eventos
traumáticos durante a vida, que podem culminar em um triste desfecho.
Eu não tinha mãe, mas tinha Nina. E Inácio também
não tinha mãe, mas tinha Olívia. E Alicinha. Estava de bom tamanho.
Ao lembrar de Alicinha, tive vontade de contar a
ele o episódio do aeroporto. Inácio ficou muito surpreso.
- Sério?!
Fiz que sim com a cabeça e brinquei:
- Ela foi muito educada, mas acho que, no fundo,
queria dizer “Estou com vontade de te sacudir, Tessa! Essa sua necessidade de
controlar tudo é patética!”.
Inácio soltou uma gargalhada.
- Não consigo imaginar a Alicinha falando assim...
- Pois é... Não falou, mas foi surpreendente. Me
ajudou muito, acredite.
Caminhávamos abraçados em direção à casa, pela
trilha de pedrinhas, admirando o brilho das novas alianças, quando Inácio
avistou Daniel do outro lado da cerca. Ele provavelmente fingiu que não nos viu
para evitar constrangimentos.
- Você chegou a conhecê-lo? – ele perguntou,
apontando discretamente na direção de Daniel.
- Sim – respondi calmamente. Um sujeito bacana.
Nada como ter a consciência tranquila, não é
verdade?
- Ele parece despreocupado – Inácio prosseguiu.
Deve levar uma vida tranquila aqui.
Não respondi, ao que ele mesmo ponderou:
- Se bem que nunca se sabe, não é? Não dizem por
aí que a grama do vizinho parece sempre mais verdinha?
- Sim, é o que dizem – confirmei, ciente da
verdade que continha aquele ditado.
Inácio então se voltou para mim.
- Agora me conta uma coisa, Tessa. Ainda não
entendi: por que você cortou o cabelo afinal? Sempre gostou dele comprido...
- É uma longa história, Inácio... Mas nós teremos
tempo para todas as histórias...
A brisa balançava as casuarinas. Olhei em volta e
notei que tudo parecia ter uma coloração diferente. Mais nítida. Seria o meu
renascimento para a beleza e o encantamento do mundo?
Voltamos para o aconchego de nosso quarto e só
saímos de lá mais tarde, vencidos pela fome.
À tarde, decidimos sair para um passeio.
Caminhamos entre as árvores por um bom tempo, em silêncio. Em harmonia. Pode
parecer estranho, mas havia uma intimidade e uma cumplicidade implícitas
naquele silêncio. Percebi que era por essa sintonia que ansiava há tanto tempo.
Eu me sentia livre, como nunca me sentira antes. Tinha
a impressão de que tirara dos ombros uma carga muito pesada, após uma longa
jornada.
Inácio escolheu ficar comigo sem saber qual seria
a minha decisão. Aquilo me impactou profundamente. Nosso amor não era líquido
ou fugaz. Era verdadeiro. Lembrei-me de que, quando ele me pediu em casamento e
eu aleguei que era cedo, ele disse:
- Você vai aprender que a duração de algo não é
critério para avaliar a sua extensão e a sua profundidade. A realidade e a
intensidade de um sentimento como o amor pouco têm a ver com o tempo ou a
continuidade. Está em outro plano.
Ele tinha toda razão. Agora eu sabia.
À noite, Inácio acendeu a lareira e tomamos um
vinho branco. Preparamos o jantar juntos, enquanto ele me contava os detalhes
de sua viagem. Compartilhamos tudo o que vivemos e experimentamos naqueles dois
meses. Omiti apenas os episódios envolvendo Daniel, por entender que, embora
tenham sido importantes no sentido de reafirmarem meus sentimentos, poderiam
ferir os de Inácio. E, talvez, ele tenha feito o mesmo. Era melhor assim. Se
ele viveu algo parecido naqueles meses em que ficou na Itália, eu preferia não
saber.
A verdade é que estávamos livres para o outro.
Livres como nunca estivemos antes. Para amar e viver.
Antes de voltar para o quarto, abrimos as portas
duplas do casarão e saímos para o jardim. Deitamo-nos na grama sob um manto de
estrelas. Apoiei minha cabeça no peito de Inácio. Então, olhei para a Vila
Mariana e o que vi foram as luzes seguras e acolhedoras que cintilavam em meio
ao imenso caos da escuridão.
Texto: Cynthia França
Revisão: Arilma Peixoto
Colaboração: Adriano Machado, Anita Lima, Fernanda Zamboni, Licínio Porto, Lília Finelli, Lorena Porto e Lucíola Pereira.
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